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A Eletrobras foi a Miami e Londres para vender seu risco; entenda por quê
Gerente de Seguros Lívia Mello conta como foi o primeiro roadshow da empresa após a privatização
Lívia Mello durante uma das apresentações do roadshow (Foto: Arquivo pessoal)
Buscando melhores termos e condições em um mercado que continua complicado para os compradores de seguros, a Eletrobras realizou no segundo trimestre seu primeiro roadshow para vender seus riscos a subscritores locais e internacionais.
O roadshow levou a gerente de Seguros da Eletrobras, Lívia Mello, sua equipe e executivos da empresa a São Paulo, Miami e Londres, com ênfase em prover transparência ao mercado e atualizar a percepção da Eletrobras junto ao setor.
Não se trata de um programa de seguros de pouca monta. Mello estima que os riscos operacionais da Eletrobras, que foram objeto do roadshow, implicam R$ 2 bilhões em coberturas de seguros. Desse total, entre 10% e 15% devem ser colocados no mercado segurador local, e o restante, por meio de contratos de resseguro facultativo.
Um dos principais objetivos é reduzir as franquias exigidas pelos subscritores, que, em uma tendência global, dispararam nos últimos anos.
Se não for possível, esperamos uma redução global do custo do programa. Se os níveis de franquia forem mantidos, esperamos que a taxa seja menor. É justamente para isso que estamos dando mais informação para o mercado.
Unificação de coberturas
A decisão de realizar o roadshow foi parte de um processo mais amplo de otimização dos programas de seguro da Eletrobras, conforme orientação da liderança do grupo após a sua privatização, em 2022.
Até então, os programas de seguros estavam pulverizados entre as diferentes unidades do grupo. Com a otimização, as coberturas de riscos operacionais da Eletronorte, da Chesf, de Furnas, da Eletrosul e da Santo Antônio Energia passaram a ser administradas de maneira unificada, sob o comando de Mello.
As coberturas de seguros da Eletrobras
Seguros de diretores e executivos (D&O)
Seguro de vida em grupo e seguro de acidentes pessoais para funcionários, diretores, estagiários e aprendizes
Responsabilidade civil geral para suas operações
Seguro empresarial abrangente para edifícios e conteúdo de endereços administrativos
Seguro de transporte nacional (terrestre, aéreo e marítimo)
Seguro de risco operacional para equipamentos em usinas hidrelétricas, parques eólicos, usinas termelétricas a gás, usinas solares e subestações de transmissão
Risco cibernético
Garantia judicial
Fonte: Eletrobras - Formulário de Referência 2023
Ela conta que a unificação dos programas gerou um ganho imediato de 45% nos valores dos prêmios de seguros operacionais pagos pelo grupo, além de reforçar consideravelmente seu poder de negociação junto ao mercado segurador e ressegurador.
O outro lado da moeda é que a apólice master de riscos operacionais se tornou bastante mais complexa. Como ela foi assinada no final de dezembro de 2022, com um vencimento de 18 meses, sua renovação prometia dar muito trabalho a Mello e sua equipe, composta por dez profissionais de gerência de riscos e seguros.
A solução foi seguir o conselho que corretores de seguros vêm dando desde o começo do atual mercado duro, em 2019: começar o trabalho de renovação o mais cedo possível.
Em janeiro, a Eletrobras realizou um processo competitivo com cinco grandes corretoras para selecionar quem lhe ajudaria a preparar a renovação de junho de 2024.
Nossa prioridade foi a qualificação técnica dos brokers, e não o preço oferecido.
Avaliação patrimonial
Em fevereiro, a Gallagher foi escolhida para dar suporte aos trabalhos, e uma das primeiras sugestões feitas pela corretora foi a de organizar um roadshow para explicar a Eletrobras no mercado brasileiro e internacional. Um trabalho especialmente necessário porque o mercado parecia ter algumas ideias equivocadas a respeito da gerência de riscos na empresa.
“A Eletrobras é uma empresa em transformação. Por conta da privatização, nós iniciamos um processo de transformação que ainda não terminou, e as apólices de seguro acabam refletindo esse momento”, diz Mello.
O trabalho começou com uma análise detalhada das coberturas já existentes, tanto das quatro empresas aglutinadas sob a apólice master em 2022, como de outras companhias controladas pela Eletrobras, como a Santo Antônio Energia, a Consórcio Baguari e a Retiro Baixo Energética.
Gaps de cobertura foram identificados, com as altas franquias entre os principais temas a serem abordados durante o longo processo de renovação. Ao mesmo, foi acelerado o processo de avaliação patrimonial dos ativos a serem segurados, uma tarefa fundamental para que as coberturas sejam as mais completas possíveis.
Hoje é comum que as seguradoras até recusem assinar o contrato por falta da avaliação patrimonial.
Vender o risco
Uma vez que o processo preparatório se completou, a Eletrobras e a Gallagher botaram o pé na estrada para vender os riscos da empresa.
A primeira parada foi em São Paulo, onde Mello e executivos da Eletrobras estiveram três dias encontrando representantes de seguradoras e resseguradoras locais.
“Convidamos mercados é que já estão nas nossas apólices e outros que não estão, para que eles conhecessem o nosso risco”, conta Mello.
Foram conversas bem interessantes, um pouco diferente da visão do exterior. Aqui se conhece a história pregressa da Eletrobras e o tamanho do Brasil. As seguradoras sabem que se trata de um país com uma dimensão continental e que a Eletrobras está presente no Brasil inteiro, com um escopo muito diverso de ativos.
Ela conta que o fato de que a Eletrobras agora é uma empresa privada, fora do controle do governo federal, também está pesando de maneira positiva na percepção do mercado local.
Miami
No exterior, porém, apesar de suas grandes dimensões, a Eletrobras é mais um grupo energético buscando as melhores coberturas junto a um mercado subscritor que, ademais de tudo, anda bastante restritivo nos últimos anos.
Por esse motivo, Mello viajou primeiro a Miami, com o suporte do diretor de Finanças Corporativas, David Alegre, e da Gallagher, para falar sobre os riscos da Eletrobras e as características do mercado energético brasileiro. Miami é hoje o principal hub de seguros e resseguros para a América Latina.
David Alegre e Lívia Mello durante a etapa de Miami (Foto: Arquivo pessoal)
Ela observou que, entre as concepções equivocadas que o mercado exterior tinha da empresa, estava a ideia de que, quando era uma estatal, não investia na prevenção de riscos e da proteção dos ativos.
Nós sempre cuidamos muito bem dos nossos ativos, e até somos um benchmark de mercado. Sentimos que esse seria um tema que surgiria nos roadshows internacionais, então tentamos focar bastante nisso.
A diretora de ativos de geração, Lilian Ferreira Queiroz, participou do road show em São Paulo para detalhar os procedimentos da empresa na manutenção de seus ativos. Alegre, por sua vez, ficou encarregado de explicar o novo estado financeiro da empresa após a privatização.
Em Miami, a Eletrobras organizou reuniões individuais com seguradoras e resseguradoras, e também apresentações híbridas tanto para participantes presenciais como virtuais. Queiroz não pôde viajar, mas participou em ocasiões através de conexões virtuais.
“Miami tem mais familiaridade com o mercado latino-americano, e eles têm também um pouco mais de noção das dimensões do Brasil, e de que a Eletrobras é responsável por 30% da geração de energia do país, 40% das linhas de Transmissão são nossas, e que portanto não se trata de um negócio de pequeno porte”, diz Mello.
Feedback positivo
Ela conta que o feedback dos participantes foi bastante positivo.
“Todos os mercados disseram que as informações que recebiam da Eletrobras eram muito obscuras, nunca completas. Expliquei que era assim devido ao processo licitatório que tínhamos que fazer quando a empresa era pública e não conseguia chegar no mercado de forma direta. A gente era obrigado a fazer uma licitação de seguradora, e a seguradora que tinha que propor as coberturas. Agora a gente está em um movimento contrário,” afirma.
Se antes a empresa tinha que elaborar um edital muito completo para que as seguradoras analisassem, a verdade é que era impossível incluir todos os dados necessários para o processo de subscrição.
Agora, porém, a Eletrobras pode colocar muitos mais dados à disposição do mercado. Mello conta que mais de 5 mil documentos foram apresentados à Gallagher para preparar o processo de renovação.
Com isso, foi possível elaborar um processo mais transparente, despertando o interesse de um grupo mais amplo de subscritores.
Alguns mercados nos disseram que a nossa subscrição era feita um pouco às cegas. E quando é às cegas, o seguro fica mais caro.
Transparência
A transparência implica admitir que às vezes a companhia não fazia algumas coisas da maneira como o mercado mais valoriza.
Por exemplo, Mello explicou aos subscritores que a Eletrobras costumava realizar uma seleção de riscos, buscando coberturas para todas suas propriedades, mas não necessariamente para todos os equipamentos nelas contidos.
Assim, houve casos de sinistros em que parte dos equipamentos afetados não estava coberta, e por isso as perdas seguradas não alcançaram a franquia necessária para acionar a cobertura.
“Um dos motivos porque estamos fazemos a avaliação patrimonial dos nossos ativos é que agora queremos cobrir 100% dos nossos equipamentos,” observa.
Londres
Queiroz, Mello e Alegre em Londres (Foto: Arquivo pessoal)
A última parada do roadshow foi Londres. Alegre e Queiroz também viajaram à capital britânica para dar suporte a Mello e sua equipe.
“Em Londres, reduzimos um pouco o escopo da apresentação, já que tínhamos menos tempo em cada reunião. Lá eles são muito mais objetivos”, lembra Mello. “Otimizamos as reuniões, que acabaram sendo superprodutivas, com perguntas bem pontuais.”
Uma pergunta que sempre aparece, segundo ela, foi referente ao impacto das enchentes do Rio Grande Sul sobre os ativos da empresa, o que mostra que o risco catastrófico brasileiro já está no radar do mercado global.
A visita a Londres foi especialmente importante porque um dos objetivos da Eletrobras é renovar seu painel de resseguros, e o mercado londrino anda com muito apetite por risco latino-americano.
Agora é conferir quais foram os resultados de tanto trabalho. Mello está confiante, mas também consciente de que uma relação de transparência com o mercado rende frutos que vão além de um único processo de renovação.
Nosso objetivo não era voltar de viagem com capacidade colocada, mas mostrar ao mercado que estamos abertos e disponíveis para fornecer todo tipo de informação para que a nossa precificação seja a mais real e honesta possível.
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